segunda-feira, 24 de maio de 2010

OS SAPOS

Enfunando os sapos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra


Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
-"Meu pai foi à guerra!"
-"Não foi!"-"Foi!"- "Não foi!"

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: -"Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma

Clame a saparia
Em críticas céticas
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."

Urra o sapo-boi:
-"Meu pai foi rei"-"Foi!"
-"Não foi!"-"Foi!"-"Não foi!"

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
-"A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo."

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
-"Sei!"-"Não sabe!"-"Sabe!"

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...

André K. Furuie 03
Bibliografia: livro Estrela Da Vida Inteira Manoel Bandeira

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